Marinha e a segurança dos Cacilheiros do Tejo!


Muito se tem falado sobre a natureza da Marinha, por contraposição à Polícia Marítima.
Num passado recente foi notícia em vários jornais que a Polícia Marítima e o SEF realizaram uma operação policial. O resultado apreciável: 530 pessoas fiscalizadas, 1 detido, 3 cidadãos ilegais, 10 identificados por posse de droga, e apreendidas 170 doses de haxixe, 30 de liamba e diverso material contrafeito.

Para espanto dos que ainda se surpreendem com tais coisas, um jornal em concreto dava conta, numa caixa de texto sobrelevada, vestida com a foto do atual CEMA, “Luís Fragoso, a Marinha chefia dá mais segurança aos cidadãos com operação nos cacilheiros”.

Perguntar-se-ão os leitores: mas que tipo de operações desenvolve a Marinha nos cacilheiros? A que tipo de segurança se refere? De que forma a concretiza?

De acordo com a Lei de Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), a Marinha é um ramo das Forças Armadas, e tem por missão principal participar, de forma integrada, na defesa militar da República, nos termos do disposto na Constituição e na lei.

Reza a Constituição, que às Forças Armadas incumbe a defesa militar da República, com objetivo de garantir, no respeito da ordem constitucional, a independência nacional, a integridade do território e a liberdade e a segurança das populações contra qualquer agressão ou ameaça externas.

Em resumo, a Marinha atua na defesa militar da República, com certeza, com inquestionável proficiência.

Mas para que a Marinha ofereça segurança aos cidadãos nos Cacilheiros do Tejo, através de operações, terá de atuar, noutro âmbito: no plano da segurança interna!

E tratando de operações policiais, como é o caso, com os resultados evidenciados na notícia, teria de ser uma Polícia criminal.

No que concerne à segurança interna, recalcada a questão pelas propostas e estratégias de maximização da atuação das Forças Armadas no plano interno – escrutinadas pelo olhar atento dos conservadores da CRP – continua a existir uma linha que separa as competências das Forças Armadas, das competências de Polícia, sendo ilícita a intervenção das primeiras no âmbito policial, para além da cooperação no combate a agressões ou ameaças transnacionais (vd. Art.º 1º nº2 e art.º 4º, nº1 al. e) da LOBOFA) – excetuados os estados de exceção.

A polícia tem por funções defender a legalidade democrática e garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos; As medidas de polícia são as previstas na lei; A prevenção dos crimes só pode fazer-se com observância das regras gerais sobre polícia; A lei fixa o regime das forças de segurança, (vd. Art.º 272º da CRP).

E é a Lei de Segurança Interna que define quadro jurídico-legal da atividade desenvolvida pelo Estado no âmbito da segurança interna e enumera as entidades que exercem funções de segurança interna, não estando, por razões óbvias, no elenco, qualquer dos ramos da Forças Armadas.

Sabendo que a fiscalização de pessoas num Cacilheiro do Tejo, a detenção de um suspeito da prática de crime, a identificação de cidadãos, a apreensão de haxixe, liamba e material contrafeito, são medidas de polícia, e nessa qualidade só poderão ser executadas pelas Polícias, nem os teoréticos de leitura enviesada do texto constitucional, poderão defender que a Marinha oferece mais segurança aos cidadãos nos Cacilheiros do Tejo, pois não poderá oferecer um produto que lhe está constitucionalmente vedado em situações de normalidade democrática.

Miguel Soares
Presidente da Direção Nacional da ASPPM
Artigo de Opinião enviado ao Diário de Notícias em 3 de março de 2014

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